Há pouco mais de um ano e meio, quando comecei o curso de moda, minha turma era gigantesca, com quase 50 alunos. Logo depois do primeiro projeto integrador (avaliação semestral), notei que boa parte da turma havia desistido, trancado ou mudado de curso. Depois das férias de fim de ano, mais uma surpresa: turma mais enxuta ainda!
Notei que boa parte das pessoas que saíram logo de cara, no primeiro semestre, eram pessoas que entraram no curso com uma linha de pensamento equivocada: era gente que gostava de consumir moda, mas não estava disposta a estudar os porquês da moda.
Até hoje, entre os que ficaram, às vezes nos deparamos com diálogos do tipo "me arrependi por não ter optado por publicidade, design gráfico ou de interiores"...
A decepção de algumas pessoas se dá também logo depois de descobrirem que não vão apenas ficar falando sobre a it bag da Prada que aquela blogueira famosa tá usando ou sobre as tendências da próxima estação. (Isso também faz parte, mas) Muito mais importante que isso são assuntos teóricos relacionados a filosofia, antropologia e história da arte e do design, da indumentária e etc., que têm uma grande importância no curso e que nos fazem ver o mundo e a moda sob outra perspectiva.
É chato às vezes, nem todo mundo gosta, mas faz toda a diferença.
Acreditem, é verdade, e pra evitar que o mesmo aconteça com você que está lendo este post (em dúvida se ingressa ou não nessa aventura) eu resolvi esclarecer algumas coisas. Mas se você só tem curiosidade em saber o que faz um estudante de moda durante todo o período do curso, fique à vontade, este post também vai interessar a você!
A grade curricular do curso varia de instituição pra instituição, mas, basicamente, você vai encontrar em todos:
-Ilustração
A gente aprende dois tipos de desenho: o fashion (aqueles croquis magros e estilizados) e o técnico (que é o desenho da roupa com todos os detalhes possíveis, que vai servir de guia na hora da execução da peça). As aulas incluem desenho de observação, noções básicas de anatomia e técnicas como aquarela, pincel marcador e colagem, aí depois a gente junta tudo pra criar croquis, books, estampas e etc.
-Modelagem
São dois tipos de modelagem também: a plana (pra fazer aqueles moldes de papel tipo os da revista manequim) e a tridimensional (pra fazer roupa sob medida modelando direto no manequim). Eu particularmente não tenho muita afinidade com essa área, mas, basicamente, é através dela que conseguimos executar nossas idéias, ou seja, é extremamente importante! Sem uma noção mínima de modelagem, é impossível trabalhar; a gente desenha coisas surreais, às vezes, que cabem só no papel, e só descobre quando coloca a mão na massa e encara manequim e tecido de frente.
-História
Da moda, da arte e do design.
Essas geralmente são as aulas em que a sala fica mais vazia na minha turma. Tem muita gente que não gosta de teoria, mas é uma delícia descobrir como as coisas eram feitas/inventadas no passado. É quase como ouvir uma história contada pela nossa avó ou como encontrar um baú cheio de coisas vintage super legais, sabe? Só que dentro de uma sala de aula, com textos mais elaborados.
-Tecidos
Nessa disciplina a gente estuda composição, trama, tipos de fibras e outros termos técnicos relacionados a tecidos e não tecidos que a gente vai usar depois. Com a vivência, a gente aprende a escolher o melhor material pra cada tipo de roupa, visando caimento, acabamento e beneficiamento.
-Pesquisa
Pesquisar é uma delícia. Você começa a crescer e evoluir quando se permite imergir em novos temas e assuntos que eram, até então, novidades para você.
A regra é simples: quanto mais intenso o trabalho de pesquisa, mais rico o resultado do seu trabalho, e nas disciplinas relacionadas a pesquisa, a gente aprende métodos para explorar cada assunto/tema de forma mais eficaz.
Uma possível lordose ou desvio de coluna: estudante de moda carrega muuuito material, principalmente no fim do semestre, quando a coisa aperta!
Ficar pobre: as listas de materiais são tipo um buraco negro que sugam todo o seu saldo bancário.
Se decepcionar um pouco com o mercado: você vai descobrir que as coisas não são tão bonitas quanto a gente vê nas araras e campanhas por aí... Particularmente aqui no Brasil (mas não é exclusividade nossa não, viu?), as dificuldades mercadológicas são muitas e desanimam um pouco, às vezes. Sonhar ou começar algo próprio pode ser muito difícil com o panorama atual, mas não pode deixar a peteca cair, se isso é realmente o que você quer!
Repensar sua visão de mundo: essa é uma das partes mais legais do curso; a cada texto lido e debatido em aula, a cada novo exercício etc., a gente muda um pouquinho e isso é algo extremamente satisfatório!
Você provavelmente vai adorar:
Desenhar: a gente desenha bastante, e essa é uma das minhas partes preferidas!
Ver o resultado das sofridas semanas antes da banca: a gente quase enlouquece às vésperas, mas é uma delícia ver o resultado do trabalho de todo um semestre!
Entender melhor os desfiles: é muito mais legal assistir desfiles e ter algo a comentar ao invés de simplesmente dizer "adorei" ou "achei ridículo". A gente vai aprendendo a avaliar com critérios técnicos o que os estilistas estão propondo pra cada estação no decorrer do curso, à medida que aprendemos sobre os princípios do design e afins.
Se você já tiver essa habilidade, vai ajudar bastante. Se não, dá pra aprender bastante com as aulas, mas importante mesmo não é ter um traço lindo, é conseguir expressar suas idéias!
Usar o photoshop
Esse sim, eu recomendo estudar um pouco antes! Eu já usava a ferramenta e isso me ajudou bastante.
As aulas no curso são bem direcionadas pra ilustração de moda, e pode ser que você acabe fazendo algo que nem ao menos sabe por que está fazendo, sabe... Vi isso acontecer com muita gente da minha turma, porém, se não rolar de você aprender antes, minha dica é: preste muita atenção nas aulas e treine em casa, pra não ficar no prejuízo!
Notebook, porque você vai precisar de um computador por perto todos os dias da semana, seja pra pesquisar uma imagem de desfile, seja pra receber e-mail dos professores, seja pra acompanhar suas notas. E olha, nem vem com historinha de que smartphone faz tudo isso, porque ainda não inventaram photoshop, illustrator e powerpoint eficientes pra celular, viu? Rs
Mesa digitalizadora, pra evitar dores no pulso, no cotovelo, no ombro etc.
No segundo semestre, tive tanta dor nos braços (por causa do uso contínuo do mouse) que quase reprovei em algumas disciplinas. Definitivamente, não é obrigatório, mas vai te ajudar a renderizar suas ilustrações e te trazer um pouquinho de conforto!
Assinatura de revistas de moda: depois de algum tempo, na verdade, você nem vai conseguir ler nada mais, mas ter acesso de maneira regular a editoriais e fotos de desfiles é uma mão na roda.
Eu recomendo a Vogue, a FFW Mag, a Harpers Bazaar e a L'Officiel. Se você tiver acesso a revistas internacionais, levante as mãos pro céu e faça uma oração de agradecimento! Minhas preferidas da gringa são Dazed and Confused, ID, Nylon, Numero e Vogue Italiana e Francesa.
Uma mochila bem grande e resistente pra aguentar o tranco, "destruir" alguns de seus looks e carregar tudo que foi listado acima.
É sério isso e nem adianta torcer o nariz, tá?! Eu demorei a aceitar que seria necessário abrir mão de uma bolsa bonita combinando com cada look pra ir às aulas, mas quando eu vi que nem tudo que eu precisava levar pra faculdade cabia na bolsa e que minha coluna tava doendo demais, me rendi e tive um pouco mais de qualidade de vida, rs. Não é o mais elegante, mas é a alternativa mais eficiente!
Em algumas disciplinas, a avaliação se dá de forma teórica, com provas, seminários, dissertações e relatórios, e em outras, através de trabalhos práticos, que vão desde a execução de um protótipo da peça que a gente desenha até um projeto interdisciplinar, no qual a gente junta todo o conhecimento do semestre, cria uma pequena coleção e apresenta pra uma banca de professores.
Fim de bimestre é previsível como final de novela mexicana: a gente sempre tem 575832 coisas pra fazer ao mesmo tempo. A dica é se organizar, por mais difícil que possa ser. Não esqueça que a lei de Murphy adora os universitário, viu?
Bom, é isso!
Eu sei que algumas coisas podem ter soado muito cruéis, mas tentei trabalhar apenas com verdades no texto, expondo meus sentimentos reais em relação ao curso. Tentando ser mais real, aliás, levei minha câmera pra faculdade e filmei as atividades em sala durante algumas semanas, tentando captar o espírito de cada aula e cada trabalho. O resultado você vê a seguir:
Pra finalizar, gostaria apenas de dizer que já vinha planejando, escrevendo e filmando cada parte deste post há bastante tempo, e só não tinha colocado ele no ar por falta de tempo. Ele vem também como resposta a várias dúvidas e pedidos que recebi por e-mail, e espero, de coração, que possa ajudar pessoas que, como eu, antes de decidir que caminho seguir, usaram o google como um amigo pra sanar questionamentos.
A caixinha de comentários tá livre aqui em baixo e meu e-mail está sempre a postos. Quem ainda tiver alguma dúvida, sinta-se à vontade e entre em contato.
Bjs do Math!
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